O debate sobre o PL da Dosimetria ganhou novos contornos após especialistas em direito penal alertarem que o texto aprovado na Câmara dos Deputados não se restringe aos condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 — como afirmam seus defensores. Segundo juristas consultados, a proposta altera a Lei de Execução Penal de forma ampla, impactando diretamente criminosos comuns e reduzindo o tempo mínimo para progressão de regimem diversos tipos de crime.
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A análise técnica aponta que o projeto flexibiliza percentuais historicamente utilizados para definir quando um preso pode avançar de regime fechado para semiaberto ou do semiaberto para o aberto. Até então, réus primários em crimes sem violência progrediam após 20% da pena, enquanto reincidentes precisavam cumprir 30%. O PL reduz esse percentual para 16% (um sexto da pena) em grande parte dos casos — mudança que, segundo especialistas, representa um “afrouxamento relevante” das regras atuais.
O professor de direito da PUC-RS, Rodrigo Azevedo, aponta que o texto beneficia sim criminosos comuns, mesmo que essa não seja a intenção declarada.
“Ele padroniza o marco básico de progressão em um sexto da pena, deixando percentuais maiores apenas para crimes violentos e hediondos. Isso reduz sensivelmente o tempo de prisão para crimes comuns não violentos”, explica.
O criminalista e professor da PUC-Rio, João Vicente Tinoco, reforça que a proposta retrocede parte do endurecimento previsto no pacote anticrime aprovado em 2019.
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“O PL dá um passo atrás. Não retorna completamente ao modelo anterior, mas reduz o rigor estabelecido em algumas situações”, afirma.
Relator nega impacto em crimes comuns, mas especialistas contestam
O relator do projeto, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), sustenta que o texto foi construído para exclusivamente tratar dos condenados por crimes relacionados ao 8 de janeiro, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro, que se tornou réu por tentativa de golpe de Estado.
O parlamentar afirma categoricamente:
“Não há nenhuma possibilidade de este texto beneficiar crime comum. Ele trata apenas do 8 de Janeiro.”
Contudo, os especialistas ouvidos rejeitam esse argumento.
Azevedo observa que a Lei de Execução Penal é de aplicação geral e não pode ser direcionada a um grupo específico.
“Não existe no Brasil lei de execução penal para um caso isolado. Toda mudança afeta o sistema como um todo”, afirma.
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Ele exemplifica: hoje, um condenado por roubo só progride após cumprir 40% da pena. Com o novo texto, se for primário, poderá progredir após 25% demonstrando que o PL gera impacto direto em crimes não relacionados ao 8 de janeiro.
O que muda com o PL da Dosimetria
O projeto estabelece:
Progressão a partir de 16% da pena para a maioria dos condenados;
Regras mais brandas inclusive para crimes com violência ou grave ameaça;
Exceções que elevam as exigências apenas para crimes previstos nos títulos 1 e 2 do Código Penal (contra a pessoa e contra o patrimônio).
Tinoco alerta que vários crimes violentos não estão nesses títulos, o que abre brecha para progressões mais rápidas.
“É muito delicado mudar a lei para atender um caso específico. Isso gera distorções difíceis de prever”, afirma.
Contradição com o PL Antifacção
Azevedo também aponta que o PL da Dosimetria entra em choque com o PL Antifacção, aprovado pela própria Câmara dias antes, que endurece a progressão para integrantes de facções e milícias.
“Aprovar projetos que caminham em direções opostas fragiliza o Sistema Único de Segurança Pública e cria insegurança jurídica”, afirma.
Próximos passos
O texto segue agora para análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, onde será relatado pelo senador Esperidião Amin (PP-SC), aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro e defensor da anistia total aos condenados por 8 de janeiro.
A votação está prevista para quarta-feira (17).
FONTE: Agência Brasil








