* Cláudio Guimarães, advogado e professor universitário da Universidade Católica Dom Bosco.
Certa vez, o empresário Abilio Diniz – filho do fundador do Grupo Pão de Açúcar – afirmou que o maior erro de sua história foi o fato de não ter realizado um contrato “bem feito” com o grupo francês Casino em 2005, quando foi definida uma maior capitalização Grupo Pão de Açúcar e acertado a transferência de seu controle para o sócio francês.
Segundo o empresário, “esse foi um grande erro, porque em 2005 a gente já era sócio, viramos sócios em 1999 e aí fizemos um aumento de capital e foi definido um contrato ali e isso não foi bem feito e resultou em uma das maiores brigas societárias internacionais. Então, eu aconselho, na hora do contrato, olhe com profundidade, se organize, ali é a hora de brigar, de ver o que está claro e o que não está. Se você contratar mal, a chance de discutir é enorme.”
A experiência mal sucedida de Abilio Diniz, empresário experiente e de sucesso, reforça um fato negligenciado por muitos brasileiros: a importância de um contrato bem feito, no momento de se fechar algum negócio jurídico.
Existe um vício entre nós de sermos, muitas vezes, “práticos” demais na hora de sentarmos à mesa de negociação e fecharmos um contrato. Não é incomum advogados escutarem das partes que, uma coisa ou outra não precisa estar no contrato, pois segundo eles, “não terão problemas com aquilo”. As pessoas parecem contratar, muito mais pela formalidade do que pela necessidade de resguardar interesses.
De fato, para a surpresa de muitos, o próprio sistema legal brasileiro não prevê como regra a formalidade nos contratos de modo que, boa parte dos mesmos não exigem solenidades e admitem até mesmo a forma verbal, muito embora não recomendada. Outro ponto importante também aponta no mesmo sentido, de modo que até mesmo o consentimento – que é essencial aos contratos – admite a forma tácita.
O contrato é o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas, fonte de direitos e obrigações para um fim qualquer. Nele se assumem compromissos ou obrigações, assegurando direitos. Segundo a jurista Maria Helena Diniz, “contrato é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial”.
Assim, como o contrato é um criador de direitos e obrigações para as partes envolvidas, é de suma importância que suas cláusulas sejam muito bem discutidas antes de ser finalizado. Um contrato, muito mais do que expressar a vontade das partes, deve também prever consequências e eventuais problemas futuros, para quando e se estes ocorrerem, as partes puderem encontrar a solução para os mesmos no contrato assinado.
É absolutamente negligente aquele que pensa que “tal coisa nunca irá acontecer e que por tal motivo, desnecessária a sua previsão no contrato”. Quase sempre as circunstâncias em que um contrato é celebrado não se prolongam com o tempo e muitas vezes, a situação pode deteriorar-se, não sendo mais aquele “excelente contratante” aquela pessoa que a outra parte idealizou quando da contratação.
Segundo a autonomia da vontade – um de seus princípios básicos – as partes possuem a liberdade de contratar, de escolher o tipo e o objeto do contrato e de dispor o conteúdo contratual de acordo com seus interesses, a serem regulados. E de acordo com a obrigatoriedade do contrato, o mesmo faz lei entre as partes e, portanto, possui efeito vinculativo e deve ser cumprido.
Assim é de suma importância que as partes ao celebrarem um negócio, esgotem todos os pontos importantes naquilo que pretendem ajustar. Vale lembrar que muitas vezes, um contrato poderá regular uma relação de anos, como acontece, por exemplo, com as locações. Prazos, aspectos legais do negócio, responsabilidades, multas, garantias para o caso de descumprimento do objeto principal ou de alguma cláusula específica, análise da saúde financeira e solvabilidade da parte bem como de eventuais garantidores (fiadores, por exemplo), são apenas algumas das coisas que deverão ser observadas com muito cuidado.
Indubitavelmente, o advogado é o profissional habilitado, preparado e indicado para acompanhar uma contratação, desde a fase das tratativas até a celebração do negócio. Durante o curso de direito, este profissional estuda a teoria e as modalidades das obrigações, a teoria e os contratos em espécie, estuda sobre as consequências do inadimplemento, estuda a responsabilidade civil e ainda aprende sobre as garantias, tanto as pessoais como as reais (que vinculam coisas).
Nunca faça um contrato com pressa. Às vezes é melhor perder um negócio mal contratado. E em tempos de praticidade com a internet, tome muito cuidado com modelos prontos de contratos encontrados em vários sites. Lembre-se sempre que o contrato deve refletir em seu conteúdo, a sua vontade, a de seu contratante e prever situações e na maioria das vezes, existem peculiaridades que não podem ser reguladas tampouco previstas em modelos prontos.
No mais, consulte sempre um advogado e nunca assine nada sem ler.