O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5852) para suspender dispositivos do Decreto 14.827/2017, do Estado do Mato Grosso do Sul, que cerceavam manifestações públicas no Parque dos Poderes, local que concentra o centro administrativo da capital Campo Grande, e previam penalidades no caso de descumprimento. “O ato normativo atinge, de um modo geral, dois dos mais importantes postulados do Estado Democrático de Direito: a liberdade de expressão e o direito de reunião, caracterizado por ser o modo coletivo de exercer o direito à manifestação de pensamento”, afirma o ministro na decisão.
Ele explica que a análise do pedido, apresentado pela Confederação Brasileira de Trabalhadores Policiais Civis (Cobrapol), foi feito “considerando a relevância e, ainda, a urgência que o caso demanda”. A entidade solicitou a suspensão de toda a norma, porém o ministro concedeu parcialmente o pedido de liminar para suspender os incisos I e III do artigo 2º, bem como o parágrafo 1º do artigo 3º do Decreto 14.827/2017. A decisão tem efeito ex nunc (não retroage) e será submetida a referendo do Plenário do Supremo.
O ministro Dias Toffoli ressaltou que a jurisprudência do STF é no sentido de não permitir o ajuizamento de ADIs contra atos infralegais, como é o caso de decreto. No entanto, ele ressalta que a norma questionada não se presta a regulamentar qualquer norma infraconstitucional. “Com efeito, ao disciplinar a forma como as pessoas ou grupos se reúnem e se manifestam no espaço denominado ‘Parque dos Poderes’, o ato normativo combatido findou por inovar na ordem jurídica. Daí a possibilidade de o Decreto 14.827/2017, expedido pelo governador do Estado do Mato Grosso do Sul, ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade”, explica.
Liberdade de expressão
O ministro reconhece que algumas regras do decreto “parecem efetivamente se direcionar à proteção da segurança e do meio ambiente” no Parque dos Poderes, mas frisa que os incisos I e III do artigo 2º regulamentam diretamente os princípios constitucionais da liberdade de expressão e do direito de reunião “de forma a, praticamente, inviabilizar o seu exercício pelos cidadãos do Estado de Mato Grosso do Sul”.
No caso, os dispositivos do artigo 2º, suspensos pelo ministro, impedem a utilização de aparelhos ou instrumentos de som de qualquer natureza, bem como a utilização de qualquer forma de comunicação audiovisual. “A se entender pela legitimidade de tais prescrições normativas, não será possível a qualquer grupo de cidadãos manifestar sua posição, reivindicação ou expressão de apoio, justamente no lugar onde reclamos podem alcançar maior repercussão e receptividade, haja vista a natural concentração de autoridades públicas estaduais no ‘Parque dos Poderes’”, alerta.
Ele destaca que a Constituição, ao garantir o direito de reunião como instrumento para a concretização do princípio da liberdade de manifestação de pensamento, tem duas únicas condicionantes: que a reunião seja pacífica, sem uso de armas, e que haja aviso prévio quanto à sua realização. Essa última regra visa proteger o direito de reunião de outros manifestantes e permitir que a Administração Pública se organize para garantir a segurança de todos.
Sanções
Por fim, o ministro observa que qualquer penalidade prevista no artigo 3º do decreto fica afastada com a suspensão dos incisos I e II do artigo 2º da norma. Ele ressalta ainda que o parágrafo 1º do artigo 3º distingue, de forma “desarrazoada”, os servidores públicos dos cidadãos em geral ao prever, àqueles, “sanções disciplinares pertinentes”. Para o ministro Dias Toffoli, esse dispositivo “cria, portanto, por via transversa e por decreto, ilícitos administrativos disciplinares passíveis de sanção legal”.