Ponto de vista
* Cláudio Guimarães, advogado e professor universitário.
Esperado por muitos e atualmente questionado por outros tantos, enfim chegamos a mais um carnaval, festa que é comemorada por milhões de brasileiros, forte manifestação cultural do país. Porém, poucas pessoas conhecem a origem do carnaval, pensando que a festa é legitimamente brasileira.
Na verdade, a festa existe desde a Antiguidade. O carnaval originário tem início nos cultos aos Deuses para comemorar a fertilidade e a produtividade do solo, na Grécia de 605 a 527 a.C. Com o surgimento da agricultura, os homens utilizavam-se de rituais para festejarem o sucesso na lavoura.
O chamado “carnaval pagão” começa quando Pisistráto oficializa o culto a Dioniso na Grécia, no século VII a.C. e se finaliza, quando a Igreja Católica adota a festa em 590 d.C.
O primeiro registro de organização carnavalesca se encontrava no Egito. A “bagunça” era nada mais que dança e cantoria em volta de fogueiras. Os foliões usavam máscaras e disfarces simbolizando a inexistência de classes sociais. Tempos depois a tradição se alastrou pela Grécia e Roma, entre o século VII a.C. e VI d.C.
A separação da sociedade em classes fazia com que houvesse a necessidade de válvulas de escape, sendo dessa época o registro de sexo e bebidas, presentes na festa.
Em tempos mais modernos, a festa chega em Veneza para, então, se espalhar por todo o mundo. Dizem que foi naquela cidade que a festa adquiriu as feições atuais: máscaras, fantasias, carros alegóricos, desfiles etc.
O carnaval Cristão passou a existir quando a Igreja Católica oficializou a festa em 590 d.C. Antes, a instituição condenava a festa por seu caráter “pecaminoso”. No entanto, as autoridades eclesiásticas da época se viram num dilema, pois se tornou praticamente impossível proibir a festa. Então outra alternativa não restou a não ser a imposição de cerimônias oficiais sérias para conter a libertinagem. Mas a festa do tipo "séria" batia de frente com a principal característica do Carnaval: o riso e a brincadeira.
Somente no ano de 1545, no Concílio de Trento, foi que o Carnaval obteve reconhecimento como uma manifestação popular de rua. Em 1582, o Papa
Gregório XIII transforma o Calendário Juliano em Gregoriano e estabelece as datas do Carnaval. O motivo da mobilidade da data é não coincidir com a Páscoa Católica, que não pode ter data fixa para não coincidir com a Páscoa dos Judeus.
O cálculo é um pouco complexo. Determina-se o equinócio da primavera, que ocorre entre os dias 21 e 22 de março no hemisfério norte. Observando a lua nova que antecede o equinócio, o primeiro domingo após o 14º dia de lua nova é o domingo de Páscoa. Como o primeiro dia da lua nova, antes de 21 de março, é entre 08 de março e 05 de abril, a Páscoa só pode ser entre 22 de março e 25 de abril. O domingo de carnaval é sempre no 7º domingo que antecede ao domingo de Páscoa.
A festa brasileira surge em 1723, com a chegada de portugueses das Ilhas da Madeira, Açores e Cabo Verde. A principal diversão dos gajos era jogar água nos outros, brincadeira que até hoje se pode ver nas ruas de Olinda em Pernambuco.
O primeiro registro de um baile carnavalesco é do ano de 1840. Em 1855 surgiram os primeiros clubes carnavalescos, que originaram depois as atuais escolas de samba.
No início século XX, já haviam diversos cordões e blocos, que desfilavam pela cidade durante o Carnaval. A primeira escola de samba foi fundada em 1928 no bairro do Estácio e se chamava “Deixa Falar”. A partir de então, outras foram surgindo até chegarmos à grande festa que vemos hoje.
Atualmente o carnaval costuma ser muito questionado por alguns, tendo em vista o momento político econômico pelo qual o Brasil passa. Muitos afirmam que se o brasileiro se mobilizasse para exigir as mudanças políticas necessárias da forma que se mobiliza para a festa, seríamos um país melhor.
Existe também uma forte crítica, tendo em vista, por exemplo, os enormes gastos com a festa no Rio de Janeiro, frente à atual situação daquele Estado. E ainda há quem questione a festa por achá-la promíscua.
A verdade é que, controverso ou não, o carnaval é importante manifestação cultural de nosso povo. Não se resume aos desfiles de Rio e São Paulo, possuindo várias vertentes país afora, principalmente no Nordeste. É evento marcante da agenda brasileira, gerando empregos diretos e indiretos, além de fomentar o turismo.
A propósito, a justificativa grega e romana para festejar o carnaval, sob o pretexto de " aliviar o estresse" tendo em vista as diferenças sociais é perfeitamente visualizada entre nós. De fato, o carnaval é uma das festas mais democráticas do país, onde pessoas de várias classes participam.
Talvez seja esta a explicação para, em meio a tantos problemas, o brasileiro ainda conseguir “parar” cinco dias para “brincar” o carnaval, alguns mais comportados, outros nem tanto. Beber, pular, dançar, cantar, parece ser uma forma de relaxar e reunir forças para o resto do ano, afinal, diante de tantas mazelas, o povo brasileiro merece um pouco de diversão.