Ywyzar Tentehar brilha em 'Vale Tudo' e fortalece voz indígena

A atriz Ywyzar Tentehar, do povo Tentehar (também conhecido como Guajajara ), está vivendo um momento decisivo em sua carreira. Aos 21 anos, ela integra o elenco do remake da novela  Vale Tudo, da Globo, e prepara-se para estreias em outros projetos de destaque, como a série Tarã (Disney+), a novela Guerreiros do Sol (Globoplay) e o longa-metragem Rio de Sangue. Em entrevista ao iG Gente, a atriz reflete sobre a importância de representar a cultura indígena no audiovisual e compartilha suas expectativas para os novos desafios profissionais.

“Acredito que finalmente estamos conseguindo quebrar as barreiras impostas à nossa identidade. As pessoas ainda não estão acostumadas a ver negros e indígenas em lugares de protagonismo, e, com isso, vemos preconceitos sendo direcionados não só à nossa raça, etnia, cultura e sotaque, mas também ao nosso trabalho. No entanto, como somos povos de luta e resistência, não será fácil nos derrubar. É muito prazeroso ver nossas conquistas criando cada vez mais potência, empoderando, cada vez mais jovens a seguir sonhando e realizando”, reflete.

Ywyzar destaca que o audiovisual foi um dos principais responsáveis por criar uma visão caricata dos povos indígenas. “A influência que eu trago para a minha arte é justamente tentar desmistificar a ideia caricata criada sobre a nossa cultura. Agora, mais do que nunca, estamos tendo a oportunidade de mudar isso e mostrar nossa multiplicidade. Os povos indígenas são povos de resistência e de luta, e hoje usamos nossa arte como uma forma política de expressar nossos ideais”, afirma.

Em  Vale Tudo , a atriz interpreta Flávia, uma estudante de veterinária cheia de energia. O papel, que na primeira versão da novela foi vivido por Renata Castro Barbosa, trouxe desafios pessoais para Ywyzar, como superar o medo de cavalos. “Precisei perder o medo e assim conseguir fazer com que a relação com os bichos fosse além das câmeras. Hoje tenho me apaixonado cada vez mais pelo trabalho da minha personagem”, revela. A atriz também compartilha que recebeu apoio e incentivo de Renata, que torce pelo seu sucesso na interpretação.

“Flávia poderia ser interpretada por qualquer atriz, como foi por Renata Castro Barbosa na primeira versão. Ainda escuto absurdos, como acharem que indígenas não falam português direito ou não usam tecnologia. Minha participação na novela mostra que minha identidade indígena está no sangue e na cultura que carrego, independente do roteiro. Estou ali como atriz, não para representar uma caricatura criada por brancos, mas para mostrar nossa diversidade e humanidade”, pontua.

Além da novela, Ywyzar prepara-se para viver sua primeira protagonista em Tarã, série do Disney+ que estreia em 2025. A produção conta com a participação de Xuxa e Angélica, e a atriz revela que inicialmente sentiu insegurança em assumir o papel. “No começo, me senti muito insegura e pensei em desistir por não me sentir merecedora ou com capacidade para assumir essa responsabilidade. Mas entendi que a partir daquele momento, aquilo tinha deixado de ser sobre mim, agora é sobre a nossa identidade. Afinal, quantos indígenas você vê ocupando esse espaço de protagonismo?”, questiona.

A relação com Xuxa foi um dos fatores que ajudaram Ywyzar a se sentir mais confiante. “Ela me acolheu de uma forma tão delicada, que a relação de mãe e filha se desenvolveu rapidamente. Ela fazia questão de trazer referência da relação dela com a filha, e isso de alguma forma fazia eu me sentir abraçada e próxima”, conta.

Outro projeto que marca a trajetória da atriz é Guerreiros do Sol, novela da Globoplay que estreia em abril. No enredo, Ywyzar interpreta Isalda, uma jovem tímida de 18 anos que é levada para um prostíbulo sem saber. “Fiquei orgulhosa de estar fazendo parte de uma produção tão incrível, cercada de um elenco muito potente”, diz.

Já no longa Rio de Sangue, protagonizado por Giovanna Antonelli, a atriz vive Edilene, uma jovem indígena Munduruku. O filme aborda questões como as ameaças enfrentadas pelos povos originários em seus territórios. “Abordar esses assuntos é de extrema importância, já que muitas vezes nossos gritos de socorro são silenciados”, ressalta Ywyzar.

A atriz também reflete sobre a importância de sua família e comunidade no apoio à sua carreira. “Minha família vive na aldeia, e minha avó, que não fala português, não entende totalmente meu trabalho, mas me apoia incondicionalmente. Esse apoio, junto ao da comunidade, dá sentido ao que faço. Na cidade, enfrento julgamentos, mas sei que meu trabalho impacta quem busca referências. Minha avó me levava para estudar na cidade, mesmo sem falar português, para que eu tivesse voz. Agora, estou aqui para falar por mim, compartilhar minhas vivências e impedir que outros se apropriem de nossas narrativas”, afirma.

Ywyzar espera que sua participação em Vale Tudo e outros projetos contribua para mudar a narrativa sobre os povos indígenas. “Minha identidade de indígena está no meu sangue e na cultura que eu carrego comigo. Estou ali por ser atriz, não para representar uma figura caricata criada por pessoas brancas. Quero mostrar que somos múltiplos e diversos, capazes de ocupar qualquer espaço”, conclui.